Rui

100 anos depois…

 

Textos e homenagens

Discursos e orações à ocasião de seu falecimento

(Publicados na Revista do Supremo Tribunal, v. 50, 1923.)

 

Oração do Dr. Lemos Brito, representando a Bahia

“[…] não há, neste mundo de povo, uma alma que não chore a tremenda desgraça de perder-te. Porque nunca te ouvimos uma palavra que não fosse de bondade, um alvitre que não fosse de justiça, uma indignação que não se exaltasse contra a inconstância e contra a iniquidade.

[…] Porque preferias a impopularidade à desonra de mentires ao povo para bajulá-lo. Porque, soldado da Constituição, nunca te amancebaste com a mazorca e preferiste o grande exílio da tua proscrição a transigires com os inimigos do regímen, do povo e da moral política. Porque o teu coração era da mesma amplitude do teu gênio, e filósofo, jurista, escritor, jornalista, advogado, diplomata, homem de Estado, tem sido em tudo o maior e o primeiro, chegaste ao derradeiro de teus dias, sendo em tudo o primeiro e o maior. Porque encheste cinquenta anos de vida nacional do trom guerreiro de tuas campanhas pela liberdade e tudo tendo feito de bem pela tua Pátria, ainda mais lhe fizeste no mal que não praticaram contra ela, pelo temor que as tuas assomadas inspiravam aos trapaceiros da República!

[…] Não és mais da Bahia, porque és da Pátria. Não és somente da Pátria, porque os povos vizinhos já te proclamaram o cidadão da América […] [,]de todo o orbe te consagraram o cidadão do Mundo!”

 

Oração do Dr. Constâncio Alves, pela Academia Brasileira de Letras

“Agora, que vais partir, quem dirá dessa perda, cuja imensidade nem mesmo o teu verbo poderia exprimir?
Mas o indizível encontra a sua expressão no recolhimento da amargura de todos, no silêncio do pesar da pátria, na angústia, sem voz, da cidade que passa, em romaria, pelo teu cadáver, na mudez e na surpresa dos que, pensando que não devias morrer, agora têm a certeza de que já não vives. […] a Academia Brasileira […] reconheceu pelo seu ilustre presidente, que, não em sua casa, mas aqui [na Biblioteca Nacional] é que havias de esperar o momento da viagem derradeira; da cidade dos livros é que devias sair para a cidade dos mortos. […]

Como foste grande na multiplicidade dos teus talentos!
Como nos davas a impressão de que, dentro de ti, muitos homens trabalhavam para a glória do teu nome!

[…] ser cidadão fora o teu ideal. E cidadão foste, com a magnitude de uma vocação nunca vista; com o conselho sempre pronto para as urgências da hora; com a solução instantânea para os problemas do momento; com a pena desembainhada para as lutas necessárias; com a palavra sempre dedicada à causa da Pátria, e com a intrepidez sempre disposta a afrontar todas as tempestades da vida civil.

[…] O teu nome não é dos que se apagam ou dos que se riscam. Para que desaparecesse, seria preciso suprimir quase cinquenta anos do nosso século de vida nacional.”

 

Oração do Sr. Pedro Calmon, pelo corpo discente da Universidade

“A mocidade das escolas, pois, que diante do sepulcro do Mestre se curva reverentemente ao vê-lo no seu conchego eterno, lembra-se de ter sido argila ínfima, que recebeu na fornalha candente do seu gênio a sua forma duradoura e que se alumia com as suas centelhas, caminhando, lenta e confiantemente para os horizontes amplos que ele lhe indicou. […] Tornou-se o seu credo de homem público o catecismo infalível da geração nova.”

 

Oração do Cônsul argentino no Rio de Janeiro

“Rui Barbosa não desaparece, senhores: ficam suas obras, seus discursos, seus escritos forenses, suas conferências, sua ação parlamentar, sua biblioteca de incalculável mérito científico, político, literário e social, manancial inesgotável de eterna corrente, ao qual acudirão as gerações presentes e futuras, para beberem, em sua linfa cristalina, os conselhos, a doutrina, a ciência, a experiência e receberem as inspirações que esse espírito genial e prodigioso derramou em sua longa e fecunda passagem pelo mundo.”

 

Artigo intitulado “Rui Barbosa”, do Dr. Celso Vieira, publicado na Revista da Semana

“[…] Desde 1874, vivemos na época de Rui, no augusto domínio solar do seu pensamento. O sufrágio direto, a separação da Igreja do Estado, a causa do ensino primário e secundário, a cruzada abolicionista, a ideia federativa e a ideia republicana, o choque do exército e da monarquia, o Governo Provisório e o Estatuto de 24 de fevereiro, o habeas corpus manejado contra as ditaduras, a legalidade antijacobina, a posse dos direitos pessoais, o conceito doutrinário do estado de sítio, o debate do Código Civil, o triunfo internacional de Haia, o civilismo e a revisão, a palavra excelsa de Buenos Aires, consorciando os nossos destinos aos do mundo livre, sob tormentas de ferro e de fogo implacáveis, tudo o evoca e reflete ou nele se concentra e personifica. Até o exílio, nas brumas do caso Dreyfus, consagrou a sua fama de cavaleiro andante do Direito.
Foi o homem-síntese das nossas instituições, dos nossos combates, das nossas reformas durante meio século, o soberano da inteligência no Brasil, a única inteligência deveras temida pelos violadores da Lei nos cimos do poder […]”